maio 15, 2009

O limbo do poeta

Apesar de toda a crítica, velada ou não, Manuel Alegre afastou a possibilidade de se demarcar do PS definitivamente, e criar um novo partido. Parece claro, que o maior motivo é o de não fragmentar o partido em ano de eleições triplas – tal poderia efectivamente entregar o próximo governo ao PSD, o que seria o grande pesadelo da esquerda. É evidente que a ultima coisa que Manuel Alegre quer é ser visto como a pessoa que maior influência teve na eleição de um governo de direita!

No entanto, apesar de ser claro que M.A. esteja de pés e mão atados no que diz respeito às críticas que o afastam flagrantemente das orientações gerais do partido, o silêncio dele não vem sem um preço. Assim, parece claro que o silêncio de agora seja trocado por um ruidoso (se bem que amarelado) apoio do partido para as próximas presidenciais.

Na expectativa, ficam os seus apoiantes do Movimento de Intervenção Cívica (MIC) e da Corrente de Opinião Socialista (OPS), que tinham anunciado a sua vontade de avançar para um projecto independente do actual PS. A grande maior parte, portanto, parece condenada a ficar abandonada num limbo, pois, ao manifestarem o seu apoio à criação de um novo partido, excluem a sua participação em qualquer dos existentes, e, enquanto M.A. se retrai à ultima hora, muitos já não estarão a tempo de o fazer. Por outro lado, mesmo que avancem agora para a criação de um novo partido, sem a sua figura de proa o projecto estará condenado à nascença.

Parece evidente que a imagem de M.A. de idealista combativo e irredutível por ideais não tem como ficar incólume desta história. Não só se presta a abdicar do seu pensamento por um apoio partidário que lhe permita disputar umas eleições que ele certamente deseja ganhar, como “abandona” camaradas de ideologia no processo.

Talvez por isso mesmo, começam já a ser ventiladas as teorias de que M.A. “sente-se mais útil a ajudar a reorientar o PS à esquerda” do que a criar um novo partido. Mas, relativamente a esta possibilidade, não ignorará o poeta o quão maleável é Sócrates (tal como não ignoramos nós), e, consequentemente, como sucesso de tal empresa só poderá ser diminuto.

Também curiosa será ver qual a sua participação nas eleições que se aproximam. A sua permanência dentro do PS implicará quase obrigatoriamente a sua inclusão nas listas eleitorais. No entanto, caso seja candidato a deputado, ver-se-á “forçado” a fazer campanha por um projecto em que claramente não acredita. Terá estômago para tal? Permito-me duvidar… Por outro lado, mesmo que não seja candidato (o que teria que ser bem explicado à opinião pública), a sua participação na campanha (ou a sua ausência dela) serão certamente escrutinadas com toda a atenção pela opinião pública.

Será interessante ver como é que nos próximos episódios deste fait-divers consegue o PS e o seu incómodo Manuel Alegre e respectiva falange de apoio manter o delicado equilíbrio entre as conveniências ditadas pelas necessidades do momento, e a manutenção de valores que valem um milhão de votos mas em que o partido não acredita mais (e o próprio Manuel Alegre dá mostras de querer abandonar)...

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