janeiro 17, 2010

Vantagens e Desvantagens de andar à Boleia

Perdoem-me que me aventure um pouco pelos terrenos pantanosos do pensamento New Age, mas ao fazer a minha actualização das notícias diárias, ocorreu-me a seguinte questão: que é que têm em comum as recentes notícias sobre os casamentos de Santo António, e o anúncio da candidatura de Manuel Alegre à Presidência da Republica?

A resposta a essa questão, é dada por um excelente álbum de Roger Waters, intitulado "The Pros and Cons of Hitch Hiking".





O título do álbum traduz-se para Português, salvo melhor opinião, por "Vantagens e Desvantagens de andar à Boleia". E em ambos os casos, é exactamente isso que se passa.

A Câmara Municipal de Lisboa, do ilustre António Costa, quis andar à boleia do pseudo-progressismo do governo, e abrir os Casamentos de Sto. António a Homossexuais. A Igreja, como é evidente, reagiu, retirando-se do evento. Agora, volta a CML atrás na posição anteriormente assumida..

Já é tarde demais. A Igreja já assumiu uma posição sobre a matéria, e não consta que goze da mesma flexibilidade da CML para mudar de posição sobre as matérias. Por outro lado, num país que proíbe (ou se prepara para proibir) crucifixos nas salas de aula, discriminar o acesso a apoios públicos baseado em orientações sexuais, e ainda por cima por imposição de uma confissão religiosa, é pedir uma guerra santa às associações talibãs ateias e homossexuais.

Andar à boleia, é perigoso. Se António Costa tivesse pensado melhor nas vantagens e desvantagens da decisão que tomou, poderia ter evitado (ou não) tensões desnecessárias.

(Um aparte: mentir é feio. Se a notícia da abertura dos casamentos a casais homossexuais fosse uma "informação errada prestada pelos serviços municipais", a sua correcção teria vindo antes - e não após - da reacção do Patriarcado de Lisboa.)

No outro plano, assistimos ao regresso triunfal do D. Sebastião da esquerda, Manuel Alegre. Não terá sido numa manhã de nevoeiro que regressou, mas o anúncio da sua candidatura nas terras dos Algarves basta para a analogia.

Ao contrário do seu camarada António Costa, a boleia de Manuel Alegre é bem pensada, fruto quiçá da maior experiência do poeta, que evita habilmente polémicas inúteis com as quais não tem nada a ganhar. Lentamente, mas com eficácia inatacável, dedicou-se o poeta a minar o PS, ainda na Assembleia da República. Medindo as consequências de todas as acções, viu que as suas ambições ao posto cimeiro da estrutura estatal só poderia ser atingida com o apoio do soberano do PS, José Sócrates - mesmo que um apoio de sorriso amarelado.

Marcadas as posições intra-partido, com Sócrates liberto para o Governo com o apoio (de sorriso amarelo) de M.A,. e qualquer oposição interna à candidatura à PR eliminada, restava a M.A. entrar na viatura do milhão de votos das últimas presidenciais, e fazer-se à estrada. E às primeiras insistências de jornalistas e partidários, foi o que aconteceu.

A viatura do milhão de votos, apesar de ser uma viatura utilitária, permite boleia para mais gente. Mas apanhar boleias é uma arte que exige rapidez de raciocínio, intuição, e gosto pelo risco.



Quem sabe disso, é Francisco Louçã, e o seu Bloco de Esquerda: experimentados como são nas lides das boleias, apressaram-se a entrar na carripana. Foi uma manobra inteligente, e que pode potencialmente render uma vitória eleitoral nacional inédita aos bloquistas.

Quem parece ter ficado atrás do arbusto especado é o PS. Agora, vai ter que escolher rapidamente se entra noutra carripana, ou se ainda corre atrás de Manuel Alegre e do BE. Já vai ter o esforço extra de convencer o carro do milhão de votos a parar para ele, e o de resgatar o lugar da frente ao lado do candidato à presidência. O esforço de o fazer, esse, já é muito maior.