fevereiro 23, 2009

Prossegue o drama em alto mar...

Mais uma vez, cabe as marinhas europeias recolher as vitimas da exploracao humana. Desta vez, foi a marinha italiana que recolheu cerca de 400 (!) imigrantes ilegais em alto mar.

Nao temos a nocao das proporcoes desta tragedia humana, em que o mais fraco esta a merce da ignominia humana.

Aproveito para partilhar a minha experiencia, justamente com um bote que apanhamos entre a Libia e Malta.

Estes botes sao lancados desde os paises africanos, sem o minimo de condicoes de navegabilidade, com o maximo de pessoas la dentro, e uma vaga indicacao de para onde devem ir. E essa direccao, e, a maior parte das vezes, para bem longe, e, de preferencia, para nunca serem encontrados.

A maior parte das pessoas apanhadas por estas redes de malfeitores sao gente oriunda da africa subsariana, a tentar escapar a uma vida de miseria e de guerras, que na sua maior parte nunca viu sequer mais agua que aquela que vao tendo para beber, quanto mais um mar da dimensao de um Mediterraneo ou Atlantico.

O bote que encontramos, tinha cerca de 20 pessoas la dentro, e so nao teria mais porque nao provavelmente nao cabiam, e porque no tempo que estiveram perdidos no mar dois tinham cedido ao desespero e atirado ao mar para a morte certa.


Inicialmente, visto nenhum de nos estarmos preparados para semelhante visao, a primeira reaccao foi a de pensar que tinha ocorrido um naufragio... A realidade era no entanto bem diferente...


Nao se nota muito bem, mas eles estavam dispostos em duas filas, uma virada para o lado da fora e outro para o lado de dentro, para assim caberem melhor. O bote, cheio ate ao limite da capacidade, deixava passar agua. Viemos a saber depois, que eles estavam ha 10 dias no mar, perdidos, sem agua nem comida, constantemente a retirar a agua que se infiltrava para flutuar...

Em conversas com eles posteriormente, viemos a saber que pagaram, com dinheiro sabe-se la de que miseravel poupanca, entre 800 e 1500 dolares pelo "privilegio" de estarem ali. Isto, depois de uma viagem nada facil dos seus paises de origem ate a costa africana. Embora ja nao tenha presentes todos os detalhes, estavam representadas naquela jangada 13 nacionalidades, indo desde o Mali ate a Somalia... Tudo paises subsarianos...


Pode-se ver que todos eles parecem estar vestidos de cor de laranja... Isto e porque, provavelmente para lhes incutir mais confianca na travessia (que lhes deve ser vendida como facil), foram-lhes fornecidos casacos salva vidas. O motorzito com que a barcaca estava equipada era novinho em folha, e tinham um bidao suplente de combustivel. Nem bussula, nem mapa, nem nada!...

Quando avistaram o nosso navio, dois tripulantes saltaram para a agua em desespero. Um deles infelizmente nao sobreviveu, e com o cansaco que trazia faleceu nas maos do medico de bordo...

O segundo, pode-se ver nesta fotografia a ser salvo pelo nosso navio de apoio.

Para quem nao sabe das coisas de mar, manter o rumo sem qualquer instrumento de navegacao e quase impossivel. Para alem da falta de elementos de referencia que nos guiem, ventos e correntes desviam-nos do caminho que pretendemos seguir sem nos apercebermos. Isto, agravado pelo desconhecimento mais basico de conhecimentos de geografia (que o Sol nasce a Este, poe a Oeste), torna invevitavel que estas pobres almas se tenham perdido nas primeiras horas de viagem.

E por autentico milagre que alguns cheguem a Europa, ou sejam apanhados por navios na travessia. E, para mim inimaginavel a quantidade de gente que deve perder-se nos mares para sempre...


Apos 10 dias de privacao de agua, comida, aquecimento, ao relento e em constante exposicao com agua salgada e dejectos humanos, eles estavam nos limites da sobrevivencia... Um deles, nao aguentou a viagem de volta, falecendo pelo caminho.

Os restantes, felizmente, conseguimos leva-los a tempo de conseguirem internamento hospitalar providenciado pelo Crescente Vermelho (organizacao equivalente a Cruz Vermelha, para paises arabes), e, tanto quanto soubemos, sobreviveram todos.


Nestes periodos de crise, e bom que nos lembremos do desespero destas populacoes, em que os melhores aventuram-se desta forma incrivel para chegarem a uma vida melhor...

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