agosto 23, 2009

A comunicação no séc. XXI

Parabéns à jornalista Isabel Coutinho, que respondeu afirmativamente ao desafio de passar uma semana sem acesso às novas tecnologias da informação - Telemóvel, Internet, ebooks, etc. Acessível, apenas o que estava à mão de semear na década de 80. A história é contada no Público de hoje (aqui), e merece ser lida.

Para um jornalista, estar impedido de aceder aos últimos desenvolvimentos do mundo em tempo (quase) real, é extremamente limitativo. Assim, a história reveste-se de um dramatismo que não acredito que seja exactamente o de um cidadão comum.

Vou contar-vos a minha experiência. Também não sendo exactamente um caso típico, penso que minha experiência toca a da jornalista Isabel Coutinho nalguns pontos.

Trabalho num navio, e por motivos profissionais faço uma rotação de 5 semanas a bordo, após o qual volto a Portugal e tenho direito a 5 semanas de descanso.

A minha primeira experiência no mar, foi poucas semanas após acabar a licenciatura, em 2004. Fresquinho a sair da faculdade fui convidado por um professor a acompanhar uma campanha, algures para as bandas do Banco de Gorringe.

- A campanha, será a bordo do D. Carlos, e terá a duração de 15 dias.
- Vamos a isso!
- Será que não enjoas? Não te quero para lá a morrer todo verde, aquilo é para aproveitar!
- Hmm... Não sou muito de enjoar, nem mesmo quando fui às Berlengas...
- Ok, ficamos a contar contigo então. Aquilo vai ser com colegas franceses e italianos, portanto deve ser uma boa experiência para ti também.
- Está combinadíssimo!

E combinado ficou. A dura realidade, essa, veio pouco depois. No mar, não haveria telemóvel, nem internet, nem tão pouco telefone sequer!

Foi o pânico!

Impossível dar o dito por não dito. Lá fui.

A ausência total das comunicações foi corrigida em parte pelo voluntarismo da guarnição, que lá arranjou forma de estabelecer uma ligação de email por satélite - uma conta de correio para toda a gente, apenas texto, nunca imagens nem anexos nem nada que o pareça! Para enviar, escrever tudo e guardar a mensagem. Para receber, o remetente deveria escrever no assunto da mensagem o nome do destinatário. Duas vezes ao dia, o oficial de comunicações faria a ligação ao servidor, e enviaria e receberia as mensagens de toda a gente. Por outro lado, vim a saber que havia um número de telefone que se podia usar para contactar os navios. A chamada ia para um centro de comunicações da Marinha, e depois era transmitida via rádio para o navio - a comunicação, feita em canal aberto, estava acessível a qualquer pessoa com um rádio amador e instintos voieuristas, mas quando as saudades apertam esse é o menor dos problemas!

Claro que na esmagadora maioria do tempo havia o gigante vazio comunicacional. Nem notícias da família, nem do mundo. Como com o email, havia um resumo diário(Seria bidiário? Semanal?) das notícias mais importantes, que vinha pelo sistema de comunicações do navio, mas como tudo o que implicava contacto com o exterior, era muito curto, muito rápido, muito insipiente, muito rombo, indefinido... Nada satisfatório!

A ausência absoluta de contactos com o exterior foi extremamente penosa para todos os que, no mar e em terra, eram novatos naquelas lides. Habituado que estava ao contacto diário com família, namorada, amigos, cada segundo que passava era como uma falta de ar de saudade pura, um contar eterno de dias horas minutos segundos até ao próximo email.

Nunca hei-de esquecer o que senti quando recebi uma chamada. Já não sei que fazia, quando me vieram chamar à sala de comunicações, e me explicaram como operar o rádio: tal qual um walkie-talkie, ou os rádios da polícia e do táxi, tinha que se carregar num botão para falar. O som, ouvia-se em toda a sala. Quando estava pronto, o operador dava autorização para se estabelecer a ligação, e podia-se falar. 3 Euros por minuto. Os 5 minutos que a chamada duraram foram de uma alegria indescritível, um aliviar de um sentimento de privação que não cabe em palavras.

Hoje, alguns anos passados sobre essa experiência, continuo a fazer do mar a minha vida. Felizmente, as condições do sítio onde agora trabalho são bastante melhores, há internet, e lá vou tendo a liberdade de usar o telefone ocasionalmente. Leio o jornal todos os dias, e falo com família e amigos pela internet.

Quando, ocasionalmente, o serviço de comunicações falha, já não me custa tanto como daquela primeira vez... Acho que lá me fui habituando... A maior preocupação, é sempre a de avisar as pessoas que há problemas com a ligação, mas que de resto está tudo bem - afinal de contas a possibilidade de naufrágio é sempre uma possibilidade mais sentida que real.

No essencial, a internet, continua a ser principalmente um cordão umbilical para o mundo e para as pessoas que continuam em meu redor. Claro que lá vou postando aqui de vez em quando, mas muitos são os dias que passam - a maior parte, quando estou de férias - sem que aqui escreva.

Continuo com a noção muito clara que viveria na mesma sem internet... Mas, como diz no anúncio, não seria a mesma coisa!

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